Blogar televisão é uma coisa complicada: como se trata de um veículo em constante atualização, manter o leitor ciente de tudo o que está sendo tratado precisaria de um pouco de colaboração dele. Eu poderia comentar a ressurreição do Viva a Noite, no SBT, ontem, mas eu sei que pouca gente viu. E o outro lado da moeda é justamente não esnobar o que é pouco visto, tentar ter uma abrangência grande de temas. No caso desse texto, eu vou comentar uma recente estréia do FX norte-americano, The Riches, que, eu acredito, pouca gente viu. Mas eu gostaria muito, muito mesmo, que você, leitor, baixasse ao menos o piloto da série. Se você fizer isso, eu vou ficar imensamente feliz, porque é sinal de que a minha mensagem chegou do outro lado do computador. A mesma coisa eu vou fazer em breve, quando a quarta temporada de The Wire estrear na HBO domingo que vem. Também espero contar com você.
Sobre The Riches, eu tenho a dizer que é uma das poucas séries que me deixou arrepiado pela profundidade. Costuma-se dizer que televisão é um veículo de linguagem simples, e a prova viva de que não é está em programas como The Wire e, agora, esse The Riches. Há um tipo de dramaticidade aqui raramente vista. Talvez por estarmos desacostumados com esse tipo de tratamento narrativo, alguns momentos da série parecem chatos, tediosos, mas são, na realidade, um convite ao telespectador para pensar, refletir e desfrutar da complexidade (que dá para entender) aqui proposta.
O criador da série, Dmitry Lipkin, pelo que eu vi após muito pesquisar, está estreando ao desempenhar aqui o papel de roteirista e produtor. Logo, é louvável que uma pessoa com esse fôlego novo apareça na área. Ele escreve, em The Riches, a história de uma família de quase-nômades, que vive em um trailer, e parece ter uma comunidade no meio da mata com outras famílias que vivem em trailers. A família em que a série é centrada tem um rapaz, uma moça, um menininho (que dorme de camisola e se veste como menina, às vezes, ou seja, é um “indefinido”, como a abertura do segundo episódio frisa), o homem da casa (ou do trailer) e sua esposa, que começa a série saindo da prisão, o que acaba sendo o estopim para o início dos acontecimentos dramáticos.
Imediatamente, descobre-se que ela saiu da prisão por ser parte de uma família em que todos (todos mesmo, incluindo os mais jovens) os membros são especializados em roubos organizados, em fraudes - e há indícios de que a própria comunidade dos trailers também viva disso. A primeira seqüência da série, ainda antes de Dahlia (a mãe presa) sair da cadeia, é justamente um roubo, em que o pai, a menina e o garotinho “indefinido” vão a uma festa de reencontro de uma antiga turma do colégio e, enquanto o pai faz um discurso distraindo os ex-colegas de classe (fingindo ser um deles), seus filhos vão passando a mão no bolso dos mais desavisados e pegando o que há de valor nas mesas. Esse tratamento que a série dá a essa família que protagoniza a trama, não colocando-os como mocinhos ou vilões, lembrou-me um pouco um filme dos anos 60, Bonnie e Clyde, em que o espectador sabia que o casal estava fazendo a coisa errada (roubando), mas não conseguia os condenar por isso, tamanha a simpatia deles.
Pois bem, assim que a mãe sai da cadeia, a família a coloca no trailer e a leva até a comunidade em que sua família (pai, mãe, parentes diretos) e amigos moram (em trailers, como eu já disse). Lá, Wayne (o marido de Dahlia) arranja confusão com o primo de sua esposa e, antes de fugir da comunidade, rouba o cofre da família dela (que, por sinal, é vigiado por uma figura interessante, o pai de Dahlia, já velho, só vivendo na cama, sem conseguir falar, e que tem apenas um sino como forma de comunicação – e na hora em que Wayne está furtando o cofre, misteriosamente, o velho não toca o sino).
No dia seguinte, após o roubo, Wayne sai da comunidade com sua família e, abastecendo o trailer num posto de gasolina, encontra um velho amigo, que também mora em trailer com a família, e que o convida para ir morar em sua comunidade, dizendo que lá há grandes negócios que rendem bastante dinheiro. Wayne recusa, e o amigo que saber o porquê. Diante da insistência, os dois brigam e, cada um em seu trailer, partem para a estrada, um atrás do outro. O amigo de Wayne, irritado, fica lado a lado do trailer dele, em uma rodovia com apenas uma pista que vai, e outra que vem. E, então, acontece o inevitável: um carro (BMW) vem na direção dos dois trailers e, para evitar a batida, desvia para o acostamento, aonde perde o controle, indo floresta abaixo.
Wayne pára o carro, e seu amigo dá meia volta e foge dali. Todos da família descem do trailer e vão procurar o carro, para, supostamente, prestar assistência. Chegando lá, descobrem que havia um casal no carro - a esposa já estava morta, e o marido, que dirigia, estava com um pedaço de madeira fincado no peito, vindo a morrer momentos depois (suas últimas palavras são “Vá para o inferno”). Wayne pega dele os documentos, dinheiro (como não poderia deixar de ser) e uma carta onde descobre que ele estava de mudança, e corre para a nova casa do agora falecido homem.
Lá, a família descobre que a casa está vazia, e decidem dormir nela, assim mesmo. Na manhã seguinte, chega o caminhão da mudança, e Wayne assume o papel do morto, recepcionando as caixas e aceitando as boas-vindas dos vizinhos. O título da série se explica aí: o sobrenome do casal morto era Rich. Há, claro, a dubiedade nesse sobrenome, o que é ainda mais interessante. Wayne, agora já assumindo o papel de Doug Rich, diz que não dá mais para viver de roubos, e que agora é hora de roubar o american dream.
O episódio piloto da série conta essa saga, da esposa saindo da cadeia até a família assumir o papel dos Riches. É um episódio riquíssimo de simbologias e idéias, com cenas interessantes (Wayne limpando o sangue com dólares roubados) e diálogos memoráveis. Mas não pára por aí: o segundo episódio, que mostra a perseguição do primo de Dahlia a Wayne, para retomar o dinheiro roubado, e os desdobramentos da nova vida da família central da série como Riches (incluindo entrevistas de emprego e uma cena hilária em que Dahlia briga com a presidente da associação de moradores do bairro, arrancando um braço mecânico dela), é ainda melhor que o piloto, com mais nuances de interpretação e, também, narrativamente falando. Eu parei por aí, vi apenas os dois primeiros, mas já estou pensando em baixar os próximos episódios (até agora, o FX dos Estados Unidos exibiu apenas quatro, ou seja, já estou no meio do caminho. Serão, no total, treze episódios).
The Riches é uma série que não tem muito de comédia. Quando faz rir, é pelo constrangimento de seus personagens. A grande essência é melancólica, individualista e triste. Dahlia, por exemplo, é uma mulher que não sabe viver sem seu marido, embora não tenha orgulho dele. Ela vive drogada, e a dependência química pode ser vista como escapismo. Os filhos, todos, não desenvolveram valores humanos e caráter. Psicologicamente, são retraídos, frios, não demonstram emoções. A figura do menino que se veste de menina é bacana porque permite analisar, ali, uma criança que praticamente cresceu sem mãe (que estava presa) e com influência direta do pai. Todos os atores são bons, sendo Minnie Driver (Dahlia), uma surpresa, e já se mostrando dignas de prêmios que, espera-se, virão.
Mas é o inglês Eddie Izzard e seu Wayne que movimentam a série. Izzard tem o personagem mais difícil, porque seu Wayne é o mais profundo, e, da família inteira, é ele quem leva o seu papel como um Rich mais a sério. Ele tem que interpretar com dubiedade o personagem original (Wayne), e dar uma faceta diferenciada, mesmo que não muito, ao derivado (Doug). É operoso o que ele faz aqui, e um tipo de personagem que eu gostaria de interpretar no teatro (que é a minha praia). O Emmy que o aguarde.
A série estreou marcando uma audiência bem grande para o nível do FX, que é canal pago da tevê norte-americana, e tem tudo para conseguir outra temporada. Não deve virar um hit (ainda mais aqui no Brasil), e é por isso que eu reitero o meu convite: baixe ao menos o piloto, para descobri-la. The Riches parece uma mistura de Desperate Housewives, Weeds e Pequena Miss Sunshine, sendo mais profunda que todas essas juntas. É um primor, um brinde ao bom roteiro, e, no bom sentido, todo telespectador deveria furtar um pouco dessa qualidade. Excelente.
5 comentários:
Fiquei interessado,essa semana já vou baixar esse piloto e torço para que seja bom.É sempre bom aumentar a já extensa lista de séries imperdíveis.
Moro nos estados unidos e desde de que a serie comecou nao perco um dia. Mais na minha opiniao a melhor personagem a dona de casa drogada que fica amiga da Dalhia.
Após um post desses sobre a série, quem não se arriscaria a baixá-la já? É o que estou fazendo. :P
Vai ser exibida pelo Telecine Light, a partir de agosto.
Jah começou a ser transmitida pelo Pipoca!!
eh muito boa hj passo o segundo captulo.
eu estou trampando no horario q tah passando as pelo primero cap eu jah estou apaixonado.
aluem sabe algun site q eu possa baixala ou coprala se naum for muito cara?
vlw
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