4 de jul. de 2007

"Bianca, como Willy Wonka" - sacou?

Seria óbvio demais render meu texto a uma simples comparação irônica e coincidente na grade de um canal de televisão (Sony) que exibe em “segunda via” o excelente seriado 30 Rock. A tal comparação seria ao abismo de originalidade entre o seriado e seu predecessor na programação, ‘Til Death, uma comédia de situações que, ao invés de quebrar, reconstrói todas as barreiras que ao longo dos tempos foram quebradas – a da ousadia, a da interpretação livre para o ator, a do cunho atual, e tantas outras. Comédias de situações do passado eram assim, totalmente presas às mesmas piadas e acontecimentos. Isso serve para classificar tranquilamente ‘Til Death como uma comédia que vive no passado. E, mesmo querendo privar-me da comparação, porque ela precisaria de apoio igualmente coincidente na programação norte-americana – e não há -, eu tenho que dizer: 30 Rock é exatamente o oposto, uma comédia que parece estar a alguns anos na frente, embora as insistentes piadas com política e entretenimento datadas com o fator “right now” nos faça pensar que é a comédia mais atual do momento. Talvez seja, mas também é mais que isso.

A comédia que talvez reflita melhor o que a televisão norte-americana é atualmente também está na Sony, e no mesmo dia de 30 Rock e ‘Til DeathDesperate Housewives. A linha tênue que divide a narrativa desta série do drama para a comédia é tão sutil que simplesmente a torna passível de diversas classificações, tal qual Justiça sem Limites. Eu acho Desperate Housewives uma comédia (ou dramédia. Ou simplesmente série) incrível –achava que “Bang” seria imbatível como o melhor episódio desta temporada. E então eu acompanhei, hoje, “Into the Woods” – e reflexo perfeito do subúrbio americano, das mulheres contemporâneas. Não há, em 30 Rock, nenhum personagem assim, que sirva de espelho ao telespectador. São todos provenientes do que há de mais grotesco ou irritante da sua personalidade (com exceção, talvez, da personagem de Tina Fey). E numa temporada difícil, com constantes riscos de cancelamento, como foi essa primeira, 30 Rock percorreu toda a trajetória com vivacidade e empatia, sem precisar ser espelho.

Chamar de “comédia do absurdo” 30 Rock é exagero, embora haja uma verve absurda constante em mais da metade das cenas de cada episódio. Na season finale, nomeada “Hiatus”, o personagem de Alec Baldwin sofre um ataque cardíaco, e de uma forma inacreditável, a edição fez com que não houvesse um respingo da gravidade da situação no contexto. A suavidade das cenas relacionadas a esse incidente foram brilhantes (do “prólogo do ataque”, com Jack Donaghy em cima de sua namorada, ao “epílogo do ataque”, com Jack inconstante no leito do hospital, e sua mãe fazendo uso do medidor de batimentos cardíacos como “máquina da verdade”). Num episódio um pouco anterior a esse, “Fireworks”, a última cena, de dupla interpretação quanto a um programa de tevê baseado em fogos de artifício na plena noite ordinária de Nova York (11/9, o retorno), 30 Rock deu prova do tipo de humor que nos entrega. A graça da série está naquilo que nós montamos, e não nas claques ou piadas baratas. Se o telespectador não capta o sentido da situação, ou passa o episódio inteiro fora do ritmo da série (problema que faz com que tanta gente odeie as novelas de Carlos Lombardi), não vai gostar. Não é uma simples questão de entender a piada; é entender a idéia da série.

Talvez pessoas que não estejam ligadas aos noticiários captem uns 20% a menos de 30 Rock que o resto, eu não tenho muita certeza quanto a isso. Mas, ainda assim, estamos longe de algum dia deparar com uma comédia que nos peça inteligência para aproveita-la – e, quando chegar esse dia, é bom deixar claro que eu vou estar com um pé atrás, porque pretensão tamanha assim cheira a arrogância de criador e equipe de roteiristas. 30 Rock está uns cinco degraus abaixo desse tipo, sabendo domar a inteligência com a acessibilidade ao público de canal aberto, como a NBC (que transmite a série nos Estados Unidos). Performances como a de Tina Fey (ótima), Alec Baldwin (iluminado), Tracy Morgan (infelizmente subestimado, mas excelente aqui), Jane Krakowski (no tom) e de vários outros (fica aqui registrada a minha pergunta: “como Sean Hayes consegue ser perfeito numa participação especial de um episódio?”) mostram que mesmo os atores são beneficiados. A televisão do futuro tem a mão aberta, 30 Rock nos diz.

4 comentários:

Anônimo disse...

Tenho que começar a ver 30 Rock, urgente. Mas ainda tem um monte de battlestar e veronica Mars. Vou ver se nas ferias arranjo tempo.

Arthur disse...

Pelo menos pra mim 30 Rock foi a melhor comédia da temporada... já Til' Death é aquela que eu vejo qdo dá ...

Anderson Vidoni disse...

O texto está maravilhoso e essa comparação com Til Death deixou ele ainda melhor.

Sabe a sensação de vergonha que sente ao ver Office? Eu senti num episódio de Til Death, mas foi involuntário, é que o clichê era tão grande, descarado e mau usado, que senti vergonha.

30 Rock é maravilhosa, Alec Baldwin é Deus (Esqueça Shalhoub :P ).

Hard Ball, Fireworks, Jack-Tor. Só digo isso.

Anônimo disse...

Tu tá ixquecendo de Paraíso Tropical.